A memória sobre a questão agrária durante a ditadura de 1964-1985 a comissão nacional da verdade e a sociedade civil

Conteúdo do artigo principal

Fabricio Teló
https://orcid.org/0000-0002-4930-0309

Resumo

Considerando que a ditadura de 1964-1985 favoreceu a expulsão de milhares de camponeses e indígenas das terras onde residiam e trabalhavam, e contribuiu para o aumento da concentração fundiária, busca-se analisar de que forma a Comissão Nacional da Verdade (CNV) lidou com a busca pelo esclarecimento desses fatos. O artigo enfatiza a importância de ir além da investigação das violências físicas e abarcar também as estruturais, a exemplo do não acesso ou o acesso precário à terra. O argumento é que não apenas os direitos políticos e civis violados são dignos de atenção da justiça transicional, mas também os socioeconômicos e culturais. Por fim, sugere-se que, devido à inserção das contribuições da sociedade civil, o capítulo do relatório da CNV sobre os povos indígenas foi mais inclusivo em comparação com o destinado aos camponeses.

Detalhes do artigo

Como Citar
Teló, F. . (2019). A memória sobre a questão agrária durante a ditadura de 1964-1985: a comissão nacional da verdade e a sociedade civil. Raízes: Revista De Ciências Sociais E Econômicas, 39(1), 161–178. https://doi.org/10.37370/raizes.2019.v39.88
Seção
Dossiê: Concepções de Sociedade e Direitos de Cidadania em Questão

Referências

ARAÚJO, Ana V. Terras Indígenas no Brasil: retrospectiva, avanços e desafios do processo de reconhecimento. In: RICARDO, Fany (org.). Terras Indígenas e Unidades de Conservação da natureza: o desafio das sobreposições. São Paulo: Instituto Socioambiental, 2004.
ARAÚJO, André L. P. O movimento de apoio à resistência Waimiri-Atroari: ecos de uma ação indigenista católica contra os grandes projetos (1976-1988). Dissertação (mestrado em História). Universidade Federal do Amazonas. Manaus, 2014.
ARAÚJO, Maria P. Comissões da verdade: um debate ético-político na contemporaneidade. In: ARAÚJO, Maria P.; FICO, Carlos; GRIN, Monica. Violência na história: memória, trauma e reparação. Rio de Janeiro: Ponteio, 2012.
ATUAHENE, Bernadette. From Reparation to Restoration: Moving Beyond Restoring Property Rights to Restoring Political and Economic Visibility. In: Southern Methodist University Law Review, Vol. 60, No. 4, 2007.
BRASIL. Relatório da Comissão de Investigação do Ministério do Interior. (Relatório Figueiredo). Brasília, 1967.
_____. Direito à verdade e à memória: Comissão Especial sobre Mortos e Desaparecidos Políticos. Brasília: Secretaria Especial dos Direitos Humanos, 2007.
CALHEIROS, Orlando. No Tempo da Guerra: Algumas notas sobre as violações dos direitos dos povos indígenas e os limites da justiça de transição no Brasil. Re-vista Verdade, Memória e Justiça. V. 9, 2015.
CAMARGO, Aspásia Alcântara de. A questão agrária, crise de poder e reformas de base (1930-1964). In: BORIS, Fausto (org.). História geral da civilização brasileira. t. III: O Brasil republicano; v. 3: Sociedade e política (1930-1964.) São Paulo: Difel, 1981.
CARRANZA, Ruben. Plunder and Pain: should transitional justice engage with corruption and economic crimes? In: The International Journal of Transitional Justice, Vol. 2, 2008.
CARNEIRO, Ana e CIOCCARI, Marta. Retrato da repressão no campo: Brasil, 1962-1985 – camponeses torturados, mortos e desaparecidos. 2. ed., Brasília: MDA, 2011.
CEFAÏ, Daniel; VEIGA, Felipe B.; MOTA, Fabio R. Arenas públicas: por uma etnografia da vida associativa. In: CEFAÏ, Daniel. [et al] (orgs). Arenas públicas: por uma etnografia da vida associativa. Niterói/RJ: Editora da UFF, 2011.
CIOCCARI, Marta. Reconstruindo memórias traumáticas: camponeses e o regime militar. In: Retratos dos Assentamentos. Vol.18, No.2, 2015.
COMISSÃO CAMPONESA DA VERDADE. Relatório Final: violações de direitos no campo. Brasília: Senado Federal, 2016.
COMISSÃO DE FAMILIARES DE MORTOS E DESAPARECIDOS POLÍTICOS. Dossiê dos mortos e desaparecidos políticos a partir de 1964. Grupo Tortura Nunca Mais e Núcleo de Estudos da Violência. Recife: Companhia Editora de Pernambuco, 1995.
CORONEL, Daniel A. [et al.] Os Movimentos Sociais do campo no Rio Grande do Sul e a Reforma Agrária: do MASTER ao MST. In: Perspectivas Contemporâneas: Revista eletrônica de ciências sociais aplicadas. V. 4, n. 2, Campo Mourão, PR, 2009.
CORRIVEAU-BOURQUE, Alexandre. Beyond land redistribution: Lessons learned from El Salvador’s unfulfilled agrarian revolution. In: UNRUTH, Jon; WILLIAMS, Rhodri (orgs.). Land and post-conflict peace building. London: Earthscan, 2013.
CUNHA, Magali do N. Memória, verdade e justiça: o Projeto Brasil Nunca Mais e a comunicação alternativa nos anos de chumbo no Brasil. In: Revista Lumina, Vol. 8 No. 2, 2014.
DAVIS, Shelton. Vítimas do milagre: o desenvolvimento e os índios do Brasil. Rio de Janeiro: Zahar, 1978.
DREIFUSS, René A. 1964: a conquista do Estado. Ação política, poder e golpe de classe. Petrópolis, Vozes, 1981.
ESTEVEZ, Alejandra; ASSUMPÇÃO, Sam R.; GUIMARÃES, Vitor. O caráter de classe da ditadura e a invisibilidade dos trabalhadores. In: Re-vista Verdade, Memória e Justiça, V. 9, 2015.
FERNANDES, Pádua. Justiça de transição e o fundamento nos direitos humanos: perplexidades do relatório da Comissão Nacional da Verdade brasileira. In: NAOTO, Celso [et al]. Para a crítica do direito: reflexões sobre teorias e práticas jurídicas. São Paulo: Outras Expressões; Editorial Dobra, 2015a.
_____. As terras indígenas e a (in)justiça de transição: o Supremo Tribunal Federal e a legitimação dos crimes da ditadura militar. In: V Seminário Nacional Direitos, Pesquisa e Movimentos Sociais, Vitória/ES, 2015b.
GALTUNG, Johan. Violence, peace, and peace research. Journal of peace research, 6 (3), 1969.
GARCIA, Andrea P. Comissão da Verdade Suruí-Aikewára: uma etnografia da memória e do esquecimento. In: 29ª Reunião Brasileira de Antropologia, Natal/RN, 2014.
GRAZIANO DA SILVA, José. A modernização dolorosa. Rio de Janeiro: Zahar, 1982.
GRYNSZPAN, Mario. Mobilização camponesa e competição política no estado do Rio de Janeiro (1950-1964). Dissertação (Mestrado em Antropologia Social). Universidade Federal do Rio de Janeiro. Rio de Janeiro, 1987.
GUIMARÃES, Elena. Relatório Figueiredo: entre tempos, narrativas e memórias. Dissertação (Mestrado em Memória Social). Universidade Federal do Estado do Rio de Janeiro. Rio de Janeiro, 2015.
HAYNER, Priscilla. Unspeakable truths: transitional justice and the challenge of truth commissions. New York: Routledge, 2011.
HOLANDA, Cristina B. Direitos Humanos e Democracia: a experiência das comissões da verdade no Brasil. In: Revista Brasileira de Ciências Sociais. Vol. 33, N. 96, 2018.
HUNTER, Justine. Who should own the land? An introduction. In: _____. Who should own the land? Analyses and views on land reform and the land question in Namibia and Southern Africa. Windhoek: Konrad-Adenauer-Stiftung and Nanibia Institute for Democracy, 2004.
LIMA, Antônio C. S. O governo dos índios sob a gestão do SPI. In: CUNHA, Manoela C. (org.) História dos Índios no Brasil. São Paulo: Companhia das Letras; Secretaria Municipal da Cultura; Fapesp, 1998.
LIMA, Edilene C.; AZOLA, Fabiano A. Entrevista com Marcelo Zelic: Sobre o Relatório Figueiredo, os indígenas na Comissão Nacional da Verdade e a defesa dos Direitos Humanos. In: Revista Mediações, V. 22 No. 2, 2017.
McCALLIN, Barbara. The role of restitution in post-conflict situations. In: UNRUTH, Jon; WILLIAMS, Rhodri (orgs.). Land and post-conflict peace building. London: Earthscan, 2013.
MEDEIROS, Leonilde S. Trabalhadores do campo, luta pela terra e o regime civil-militar. In: PINHEIRO, Milton (org). Ditadura: o que resta da transição. São Paulo: Boitempo, 2014.
_____. Transformações nas áreas rurais, disputa por terra e conflitos sociais no Rio de Janeiro (1946-1988). In: MEDEIROS, Leonilde (org.). Conflitos por terra e Repressão no Campo no Estado do Rio de Janeiro (1946-1988). Relatório de Pesquisa, 2015. Disponível em: https://bit.ly/2NdbGPZ.
MORENO, Tulia [et al]. Restitución de tierras en Colombia: análisis y estudios de caso. Bogotá: Cinep/PPP, 2016.
MST. Assassinatos no campo: crime e impunidade (1964-1985). São Paulo: MST, 1986.
NUNES, Maria do R. Apresentação. In: VIANA, Gilney. Camponeses mortos e desaparecidos: excluídos da Justiça de Transição. Brasília: Secretaria de Direitos Humanos da Presidência da República, 2013.
OLIVEIRA, Luis R. C. de. Para uma sociologia do campesinato indígena. In: _____. A Sociologia do Brasil Indígena. Rio de Janeiro: Tempo Brasileiro; Brasília: UnB, 1978.
OLIVEIRA FILHO, João P. A fronteira e a viabilidade do campesinato indígena. Rio de Janeiro: PPGAS/Museu Nacional, 1979.
PEDRETTI, Lucas. A transição não subiu o morro: reflexões sobre ditadura e a política de remoções de favelas. In: Anais do Encontro Marx e o Marxismo. Universidade Federal Fluminense, Niterói/RJ, 2015.
PHELPS, Teresa. Shattered Voices: Language, Violence, and the Work of Truth Commissions. Philadelphia: University of Pennsylvania Press, 2006.
NOVAES, Regina C. Lembranças camponesas: repressão, sofrimento, perplexidade e medo. In: ESTERCI, Neide [et al.]. Fazendo Antropologia no Brasil. Rio de Janeiro: DP&A, 2001.
SAUER, Sergio e SARAIVA, Regina F. Violência, Repressão e Resistências Camponesas: reflexões e (re)construções a partir da Comissão Camponesa da Verdade. In: Retratos dos Assentamentos. V.18, N. 2, 2015.
SESTINI, Dharana P. R. A “mulher brasileira” em ação: motivações e imperativos para o golpe militar de 1964. Dissertação (Mestrado em História Social). Universidade de São Paulo. São Paulo, 2008.
SHARP, Dustin. Addressing economic violence in times of transition: toward a positive-peace paradigm for transitional justice. In: Fordham International Law Journal Volume, 35, Issue 3, 2012.
SIGAUD, Ligia; ERNANDEZ Marcelo e ROSA Marcelo. Ocupações e acampamentos: sociogênese das mobilizações por reforma agrária no Brasil. Rio de Janeiro: Garamond e Faperj, 2010.
SILVA, Liane A. L. Justiça de Transição aos Avá Guarani: a necessária política de reparação e restituição de terras pelas violações cometidas durante a ditadura militar. In: SOUZA FILHO, Carlos F. Os Avá-guarani no oeste do Paraná: (re) existência em Tekoha Guasu Guavira. Curitiba: Letra da Lei, 2016.
SRIRAM, Chandra L. Liberal Peacebuilding and Transitional Justice: what place for socioeconomic concerns? In: SHARP, Dustin (org.). Justice and Economic Violence in Transition. New York: Springer, 2014.
SZOKE-BURKE Sam. Not only ‘Context’: Why Transitional Justice programs can no longer ignore violations of economic and social rights. In: Texas International Law Journal. Vol. 50, Issue 3, 2015.
TEITEL, Ruti. Transitional Justice Genealogy. In: Harvard Human Rights Journal. Vol. 16, 2003.
TEIXEIRA, Marco A.; SILVA, Iby M.; TELO, Fabricio. Violações de direitos humanos contra camponeses nas Comissões da Verdade. Re-vista Verdade, Memória e Justiça, V. 9, 2015.
UNRUTH, Jon; WILLIAMS, Rhodri. Land: a foundation for peacebuilding. In: _____ (orgs.). Land and post-conflict peace building. London: Earthscan, 2013.
VIANA, Gilney. Camponeses mortos e desaparecidos: excluídos da Justiça de Transição. Brasília: Secretaria de Direitos Humanos da Presidência da República, 2013.
WELCH, Cliff. Camponeses, a verdade e a história da ditadura em São Paulo: In: Revista Mundos do Trabalho. Vol.6, n. 11, 2014.
WILY, Liz A. Tackling land tenure in the emergency to development transition in post-conflict states: from restitution to reform. In: PANTULIANO, Sara (org.). Uncharted territory: land, conflict and humanitarian action. Rugby, Warwickshire, Reino Unido: Practical Action Publishing, 2009.
WOOLFORD, Andrew. Transition and Transposition: Genocide, Land and the British Columbia Treaty Process. In: New Proposals: Journal of Marxism and Interdisciplinary Inquiry, Vol. 4, No. 2, 2011.