Operárias invisíveis o trabalho feminino na apicultura no Piauí, Brasil
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Resumo
A invisibilidade histórica do trabalho feminino no meio rural é produto da sua divisão sexual, que associa as tarefas desempenhadas pelas mulheres na propriedade à ajuda. Este trabalho objetivou refletir sobre a invisibilidade do trabalho das mulheres na apicultura, inclusive em estudos que buscam mensurar o valor econômico da atividade. Realizamos uma pesquisa bibliográfica relativa a esses estudos, focados no estado do Piauí, e foram conduzidas entrevistas semiestruturadas com 13 mulheres apicultoras de dois municípios, entre 15 e 55 anos, formalmente vinculadas às associações de produtores de mel. Observamos uma nítida divisão de gênero no desempenho das atividades, com o predomínio das mulheres nas atividades relacionadas ao beneficiamento do mel, aproximando-as da esfera doméstica e do cuidado. O trabalho no apiário e o macacão emergiram como marcadores de gênero. O questionamento da força física para trabalhar com as colmeias e da tolerância às ferroadas estão dentre as práticas sexistas mais frequentes experimentadas por elas. A naturalização da divisão sexual do trabalho apícola se assenta, principalmente, na identificação do trabalho feminino como uma ajuda à atividade de maridos, companheiros e pais, mesmo quando as mulheres indicam possuir as próprias colmeias e conhecimento e prática anterior aos homens com os quais trabalham. Concluímos que a participação da mulher na apicultura é lida na chave do trabalho doméstico-cuidado, ocultando-se assim a contribuição econômica de sua atividade. Considerando-se o impacto socioeconômico da atividade no Piauí, cabem mais estudos que permitam compreender as articulações entre trabalho, gênero e renda na apicultura.
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